EM PIRACICABA (SP) 30 DE NOVEMBRO DE 2021

Evento tem apelo por política pública para distribuição de absorventes

Reunião pública promovida pela Câmara reforça defesa para criação de programa municipal que ofereça o item de higiene a mulheres de baixa renda.




Toque na imagem para aumentar

Plenário da Câmara recebeu reunião pública na tarde desta terça-feira

Crédito: Guilherme Leite - MTB 21.401




O diálogo em torno da construção de uma política pública municipal para o fornecimento gratuito de absorventes higiênicos a adolescentes e adultas de baixa renda ganhou novas vozes nesta terça-feira (30), com a realização de reunião pública na Câmara. O debate serviu para jogar luz sobre a chamada "pobreza menstrual", realidade que afeta centenas de mulheres em Piracicaba e atinge milhões em todo o Brasil.

O problema, como analisado na reunião, situa-se em um contexto maior, sobre o qual pesam, por exemplo, o acesso precário de parte da população ao saneamento básico e os tabus que persistem mesmo diante da urgência de se discutir o tema. Já a solução, também encaminhada durante o encontro, passa por envolver distintas áreas (como as pastas de Saúde, Educação e Assistência e Desenvolvimento Social), garantir recursos para criar um programa de distribuição permanente e fomentar conversas em torno do assunto, como forma de dirimir resistências e preconceitos.

Promovida pelo vereador Gustavo Pompeo (Avante) e pelas vereadoras Silvia Morales (PV), do mandato coletivo A Cidade É Sua, e Rai de Almeida (PT), a reunião pública foi transmitida ao vivo pela TV Câmara e integra a programação dos "16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres".

O debate sobre o tema foi motivado após projeto de lei de Gustavo Pompeo e Anilton Rissato (Patriota) tramitar na Câmara Municipal de Piracicaba propondo o fornecimento de absorventes higiênicos para estudantes e mulheres de baixa renda como meio de prevenção de doenças e da evasão escolar, segundo os autores.

Diante de parecer contrário exarado pela Comissão de Legislação, Justiça e Redação ao projeto de lei 83/2021, sob a justificativa de que a matéria "invadiu a esfera da gestão administrativa, que cabe ao Poder Executivo", os autores decidiram retirá-lo para reformular o texto. Com a realização da reunião e a participação de segmentos da sociedade no debate, a ideia agora é encaminhar a proposta ao Executivo como indicação para que, então, o governo Luciano Almeida (DEM) envie projeto de lei ao Legislativo criando a política pública.

"Propusemos o PL, mas veio com vício de iniciativa, foi só esse o entrave que tivemos naquele momento. Teríamos votos, sim, para derrubar o veto e aprovar o projeto, mas, mais do que a aprovação, quero um programa instituído de fato, de rede, em que o Executivo se envolva e as diversas secretarias se comprometam", comentou Gustavo Pompeo.

"A menstruação não pode ser vista como tabu, a adolescente não pode sentir nojo, vergonha ou medo quando ela tem um processo natural do próprio corpo dela, que é a menstruação. Quebrar o tabu é mais importante do que o próprio PL; propusemos o PL, mas estamos tentando avançar na política pública de fato. Vamos fazer debates públicos e 'engrossar' o projeto, para que possa ser executado de forma mais eficiente pelo Executivo", completou o vereador.

Silvia Morales fez menção à sanção, em outubro, da lei federal que criou o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, porém com veto do presidente Jair Bolsonaro à distribuição gratuita de absorventes a estudantes de baixa renda de escolas públicas e pessoas em situação de rua ou de vulnerabilidade extrema, sob o argumento de que a proposta não apontava as fontes de custeio.

A vereadora também chamou a atenção para o fato de 30% das meninas no Brasil não terem acesso a produtos de higiene e serem afetadas pela pobreza menstrual. "Tivemos recentemente os vetos do presidente em artigo de um projeto de lei. Essa discussão é bem importante para que pensemos nessas questões de saneamento e pobreza menstrual e em como podemos colaborar no município."

Rai de Almeida afirmou que viveu, quando adolescente, a realidade enfrentada ainda hoje por milhares de brasileiras. "Lembro que não tinha absorvente naquela época, idos dos anos 1960, e o quanto era terrível aquela situação de menstruar e ir para a escola. Aquilo servia de piada para a turma toda, porque éramos as pobres da classe. Passei por essa situação de vexame e muita vergonha. Depois de décadas, estamos quebrando esse tabu."

A parlamentar defendeu a discussão pública sobre o tema e o envolvimento dos homens no debate. "Precisamos fazer as pautas saírem dos muros; esta não é uma luta só das mulheres. Falar da dignidade menstrual: se não fizermos isso, não romperemos com esse tabu." Ela também cobrou a consolidação de programas que garantam a distribuição dos absorventes higiênicos. "Têm que ser de fácil acesso a todas as mulheres, para que possam ter a dignidade respeitada e a intimidade protegida."

Marcela Buoro, coordenadora de saúde da mulher na Secretaria Municipal de Saúde, jogou luz sobre a pobreza menstrual em Piracicaba com dados de questionários respondidos por 784 professores e mais de 4 mil alunas, em uma ação que reuniu vários órgãos e entidades. Enquanto 90% dos docentes disseram conhecer a existência do programa Dignidade Íntima, do governo paulista, que direciona recursos às escolas para a compra de absorventes, 35,5% das alunas responderam não saber da existência da iniciativa. Entre as estudantes que participaram da pesquisa, 9 em cada 10 afirmaram que já menstruavam e 18 declararam que utilizaram pano como absorvente.

Diretora da Escola Estadual "Sud Mennucci", Marcia Aparecida Lima Vieira compartilhou como o programa estadual impactou a vida das alunas da instituição. "Este ano, pela primeira vez, tivemos uma ação direcionada a essa questão. Reuni o grêmio e disse que as meninas assumiriam esse programa. E elas assumiram inclusive a cotação de preços, com muita responsabilidade e alegria."

Os recursos do Estado chegaram à escola em junho, a campanha teve início em agosto e, em outubro, kits individuais foram entregues às adolescentes. Os absorventes passaram a ser oferecidos em uma caixinha instalada pelo grêmio nos banheiros femininos. A iniciativa na "Sud Mennucci" também envolveu os garotos, "com uma conversa grande sobre o tema, já que não é uma questão só da mulher, mas de respeito à dignidade humana", como destacou a diretora. "Nossa luta é para que isso não seja pontual, já que a necessidade de absorventes é o tempo todo. Temos que garantir o acesso a esses itens regularmente", ressaltou Marcia.

Também contribuíram com a discussão os vereadores Acácio Godoy (PP) e Thiago Ribeiro (PSC), a presidente do Conselho Municipal da Mulher, Lia Mara de Oliveira, a advogada da Sociedade Metodista de Mulheres Rosalia Ometto, a coordenadora de atenção secundária na Secretaria Municipal de Saúde, Rafaela Penedo, e a jornalista Thalita Sotero.

Saúde Gustavo Pompeo Rai de Almeida Silvia Maria Morales

Texto:  Ricardo Vasques - MTB 49.918
Supervisão:  Rodrigo Alves - MTB 42.583
Imagens de TV:  TV Câmara

Notícias relacionadas