Vereador recebe demandas de moradores do residencial Parque Piracicaba
Sindicato defende adiar alíquota de 14%; Prefeitura fala em obrigação
PLC que eleva contribuição previdenciária dos funcionários públicos municipais de 11% para 14% deve ser votado até 31 de julho; Câmara promoveu reunião para discuti-lo.
A proposta, de autoria da Prefeitura e encaminhada ao Legislativo, de elevar a alíquota de contribuição previdenciária dos funcionários públicos municipais sob regime estatutário de 11% para 14% motivou a Câmara de Vereadores de Piracicaba a promover, na tarde desta terça-feira (19), reunião para debater o tema, a pedido do sindicato da categoria.
A discussão sobre o projeto de lei complementar 4/2020 contou com a participação de vereadores, de representantes do governo Barjas Negri (PSDB) e de integrantes do Ipasp (Instituto de Previdência e Assistência Social dos Funcionários Municipais de Piracicaba) e do Sindicato dos Trabalhadores Municipais de Piracicaba e Região, presentes no plenário da Câmara.
A reunião foi exibida ao vivo pela TV Câmara e reproduzida nas redes sociais YouTube e Facebook, o que possibilitou que servidores registrassem suas dúvidas, depois lidas pelo presidente Gilmar Rotta (CID), que comandou o encontro. A transmissão pelo Facebook superou a marca de 400 visualizações e alcançou quase 1 mil pessoas, com mais de 80 comentários.
A proposta de elevar para 14% a alíquota de contribuição dos servidores municipais ao Ipasp decorre da emenda constitucional 103, de novembro de 2019, que promoveu no país a chamada "reforma da Previdência".
Embora de abrangência nacional, a medida delegou a estados e municípios com regime próprio de aposentadorias e pensões a aprovação local da majoração da alíquota cobrada de seus servidores públicos estatutários, o que deve ser feito até 31 de julho, conforme a portaria 1.348, da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho. Uma vez aprovada, a medida entraria em vigor dentro de 90 dias após sua publicação.
Em Piracicaba, o projeto de lei complementar 4/2020 foi encaminhado em 22 de abril pelo prefeito ao Legislativo. Deu entrada na reunião extraordinária do último dia 4 e, no momento, está com sua tramitação suspensa na Comissão de Legislação, Justiça e Redação, em virtude do pedido por ela feito ao presidente da Câmara para que cobrasse, em ofício ao Executivo, o envio dos estudos de impacto financeiro da proposta e do cálculo atuarial.
Segundo o secretário municipal de Administração, Evandro Evangelista, o processo de contratação da consultoria que elaborará a análise está por ora impugnado por representação de um dos escritórios concorrentes ––sem prazo, portanto, para ser retomado. A falta de previsibilidade da Prefeitura em encomendar o estudo motivou crítica da vereadora Nancy Thame (PV), que participou da reunião via internet.
Gilmar Rotta enfatizou que o Legislativo não votará o PLC sem ter dados detalhados em mãos. "Se não vierem, terá de haver uma boa justificativa falando da não necessidade de apresentação deles. A Câmara não é irresponsável de votar sem esses estudos", afirmou.
O procurador-geral do município, Milton Sérgio Bissoli, disse que o governo local é "obrigado" a implementar a proposta ––estabelecendo os percentuais de contribuição que já vigoram para servidores públicos federais–– sob risco de perder o CRP (Certificado de Regularidade Previdenciária), o que levaria Piracicaba a ficar "proibida de receber repasses e transferências voluntárias, bem como emendas orçamentárias", explicou.
"É nossa obrigação apresentar esse PLC, e da forma como ele veio. Não existe como postergar juridicamente essa obrigação", disse Bissoli. "Não é intenção do município estar, no meio da pandemia, propondo elevação de alíquotas, mas temos o dever constitucional de promover o encaminhamento desse PLC", continuou. O posicionamento do representante do governo Barjas Negri foi endossado por parte das pessoas presentes na reunião e criticado por representantes do funcionalismo.
Trabalhadores e integrantes do sindicato da categoria ressaltaram que os servidores públicos municipais já não tiveram recomposição salarial neste ano, ficarão com os vencimentos congelados até o final de 2021 ––em razão da contrapartida exigida pelo governo Jair Bolsonaro para socorrer estados e municípios ante a pandemia do novo coronavírus–– e terão mais perdas na renda com o aumento para 14% na contribuição previdenciária.
Diretor do Sindicato dos Trabalhadores Municipais de Piracicaba e Região, José Osmir Bertazzoni destacou que os funcionários públicos municipais já se juntaram aos esforços do Executivo para o combate ao novo coronavírus. "Estamos colaborando com R$ 6,512 milhões, que é o que deveríamos estar recebendo de reposição salarial de março a maio deste ano. Sempre fizemos nossa parte."
Sobre a proposta de fixar em 14% a contribuição previdenciária de toda a categoria ao Ipasp, Osmir observou que, no regime geral do INSS, "a alíquota não é definida num único propósito; elas devem ser implantadas de forma gradual, de acordo com o vencimento dos trabalhadores", tanto os da iniciativa privada quanto os do setor público. Nesse caso, a contribuição começa em 7,5% para quem recebe até um salário mínimo e chega a 14% para quem ganha de R$ 3.134,41 a R$ 6.101,06.
O mesmo raciocínio, de contribuição escalonada, deveria valer para os servidores sob regime próprio, na avaliação de Osmir, que também cobrou a apresentação, pela Prefeitura, de "cálculo atuarial homologado pela Secretaria de Previdência Social".
"Não é pegar o atuarial antigo, feito antes da reforma da Previdência, que já não serve para mais nada. Precisamos de um novo, com base em novas visões do que pode acontecer, o tempo de contribuição dos servidores e a alíquota patronal, que também é necessário ser revista, já que não pode haver dois pesos e duas medidas", disse Osmir, em relação à proposta da Prefeitura que eleva de 11% para 14% a contribuição previdenciária dos servidores, mas mantém em 22% a patronal.
Antonio Carlos Gonçalves Alves, o Cacá, que assumiu a presidência do Ipasp em fevereiro, disse ser um de seus compromissos "fazer o máximo possível quanto à preservação dos benefícios dos servidores aposentados e dos que virão a se aposentar". O instituto, acrescentou, conta com 2.500 beneficiários, com contribuições que "passam de R$ 10 milhões por mês, enquanto a patronal é de R$ 3 milhões".
"É uma preocupação grande, porque hoje o instituto é deficitário. Temos dois fundos, o de repasse e o de reserva. Houve, em 2008, a segregação de massa, com uma linha de corte, em que [aos servidores contratados] até 2003 a Prefeitura arcaria com os recursos necessários para bancar as aposentadorias e, para os de a partir de 2004, entraria o fundo de reserva", explicou.
"[Para o fundo dos servidores contratados] Até 2003, a Prefeitura deveria repassar ao Ipasp o montante devido, em torno de R$ 1 bilhão na época, mas, como não tinha caixa suficiente, houve então a segregação de massa com o déficit equacionado, como um financiamento, para o aporte mensal dos valores", continuou.
"O fundo de repasse é deficitário: por ser um fundo em que foi feita a segregação, mas com a adequação do déficit equacionado, em que mensalmente a Prefeitura faria o aporte, hoje há esse déficit", prosseguiu Cacá, observando que, conforme a lei, "os fundos que forem deficitários não podem ter uma alíquota [de contribuição] inferior a 14%".
"A questão progressiva não poderá haver, segundo a legislação, pela existência do déficit equacionado. Para que seja feita a aplicação da alíquota progressiva, há necessidade de fazer um estudo atuarial. Como temos o fundo deficitário equacionado, não se aplicaria mediante a legislação", reiterou, acrescentando que, mesmo com a majoração para 14%, "não vai se findar o déficit". "Ele vai continuar enquanto houver beneficiário do fundo de repasse."
Osmir contestou a afirmação de Cacá. "O regime do Ipasp não é deficitário. Temos um passivo atuarial cujo pagamento a Prefeitura resolveu parcelar porque nunca recolheu a contribuição patronal. Uma lei [na época] autorizou o Executivo a dar calote no Ipasp. Resolveu-se então apelar a esse sistema, foi o próprio Barjas Negri que fez, que interpreto como correto naquele momento, mas não podemos deixar passar."
"Existe uma dívida atuarial que está sendo paga pelo município, não estou criticando o que foi feito, mas, pela 'lei do calote', o município perdeu, os servidores perderam, o Ipasp perdeu e só um ganhou", continuou Osmir, sem citar nomes. "Podemos, sim, operar a alíquota progressiva porque não temos déficit no nosso sistema no momento; temos o pagamento de um passivo atuarial por parte do governo."
Na sequência, Cacá retificou o que disse. "O estudo atuarial demonstra que não teria déficit no Ipasp. Hoje o déficit é equacionado, é financeiro, necessita do repasse mensal da Prefeitura. Se em 2008 houvesse o repasse, [o Ipasp] seria autossuficiente; ele é deficiente no financeiro, não no atuarial. É deficiente no déficit equacionado, necessita do repasse mensal que a Prefeitura tem que fazer."
Evandro Evangelista listou as transferências financeiras feitas pela Prefeitura ao fundo de repasse do Ipasp "justamente para a cobertura do déficit": foram R$ 33,490 milhões em 2017 (primeiro ano do atual mandato de Barjas Negri), R$ 52,530 milhões em 2018, R$ 63 milhões em 2019 e R$ 96 milhões previstos para 2020, com projeção de R$ 120 milhões em 2021.
Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Municipais, José Valdir Sgrineiro lembrou que a opção da Prefeitura por ter dois regimes ––o regido pela CLT e o estatutário, cada um contemplando aproximadamente metade do total de 7.500 servidores–– "onerou ainda mais a questão atuarial do Ipasp".
Duas integrantes do conselho deliberativo do Ipasp informaram que estão elaborando estudo, já em fase avançada, em relação à alíquota escalonada. "Entendemos que daria para ser feito e seria importante para os funcionários que participam do regime. Fizemos cálculos em relação a tudo isso para serem apresentados."
OBRIGAÇÃO X POSTERGAÇÃO
O vereador Matheus Erler (PSDB) apontou que o governo Jair Bolsonaro, ao aprovar a reforma da Previdência, exigiu que estados e municípios reproduzissem em nível local a alíquota já aplicada sobre servidores públicos federais. "Não é faculdade do prefeito apresentar ou não a proposta, mas obrigação: se não apresenta, deixam de vir recursos do governo federal. O Executivo federal impôs a majoração da alíquota dos servidores municipais para o valor mínimo de 14%, não se pode ter menor que isso. É uma situação muito difícil, prefeito nenhum queria estar numa situação dessa, ainda mais num momento como este."
Relator da Comissão de Finanças e Orçamento da Câmara, Isac Souza (PTB) propôs que a Casa faça uma consulta ao Ministério da Economia para verificar a possibilidade de a incidência da nova alíquota só passar a valer no próximo ano. "Se não houver anuência do Ministério da Economia, não há o que fazer. Essa situação é como se colocasse uma amarra em nós: 'Ou se cumpre ou se cumpre'. Da forma como é colocada, dá pouco espaço para discussão. Os municípios simplesmente têm que se adequar, senão perdemos o Certificado de Regularidade Previdenciária e passamos a não receber alguns repasses."
A possibilidade de postergar a decisão para o ano que vem foi endossada por Osmir, diante da crise instalada pela pandemia do novo coronavírus. "Que tenhamos o bom senso neste momento de caos econômico, que atinge também o bolso dos servidores. Não há qualquer objeção do município; pode fazer isso e passar a vigorar no ano que vem, com uma visão melhor da situação financeira. Neste momento, seria um aceno de respeito por parte da administração municipal não forçar a majoração."
Gilmar Rotta pediu que o encaminhamento de Isac Souza, pela consulta ao Ministério da Economia, seja avaliado pelo presidente da Comissão de Legislação, Justiça e Redação, José Aparecido Longatto (PSDB).
Longatto, que é líder do governo Barjas Negri na Câmara, pediu "que haja bom senso". "Somos obrigados a votar, enfiaram goela abaixo para nós; se não votarmos, o município vai perder muito mais receita ainda. Vai prejudicar os funcionários públicos municipais, mas o município vai continuar vivo e os salários serão mantidos. Se aprovarmos, vai prejudicar uma parcela dos piracicabanos; se não aprovarmos, vai prejudicar Piracicaba toda."
Por conta das medidas adotadas pela Câmara para o combate ao novo coronavírus, não foi permitida a presença de público na galeria do plenário. Além de Gilmar Rotta, Matheus Erler, Longatto, Isac Souza e Nancy Thame, também acompanharam a reunião os vereadores Pedro Kawai (PSDB) e Marcos Abdala (REP).
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