EM PIRACICABA (SP) 21 DE OUTUBRO DE 2020

Eleições 2020: Fim das coligações na disputa para vereador é novidade

Juízes eleitorais e cientista político acreditam que emenda constitucional colabora para o equilíbrio entre os poderes




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Humberto Dantas: nova regra corrige distorção histórica

Crédito: Davi Negri - MTB 20.499





As eleições deste ano serão atípicas e não será apenas em função da pandemia do novo coronavírus, que alterou o calendário de votação e forçou protocolos de segurança sanitária na hora de votar. Uma das principais novidades é o fim das alianças políticas entre os partidos para o cargo de vereador, ou seja, o veto às coligações partidárias, definido na emenda constitucional 97/2017.

A coligação partidária é a união de dois ou mais partidos políticos, por período determinado, para que ele dispute conjuntamente as eleições, como se fosse um único partido, inclusive em direitos e obrigações.

O fim das coligações somente está sendo aplicado nas candidaturas de vereadores, nas chamadas eleições proporcionais. Segundo o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), a união de diferentes partidos em apoio a um candidato para o cargo de prefeito (nas eleições majoritárias) continua sendo possível.

A partir de 2022, as mudanças serão aplicadas nas eleições proporcionais para os cargos de deputados, mas os partidos poderão formar chapas para os cargos de senador, governador e presidente da República.

Um dos pontos defendidos para a aplicação da mudança é que a lei nunca exigiu afinidade ideológica para os partidos se coligarem, por isso, era comum um eleitor votar em um candidato de determinado partido e ser eleito outro pela coligação, porém, com bandeiras diferentes das suas.

"Para o eleitorado, era algo completamente estranho, não apenas na hora do voto, como no exercício do mandato", avalia o doutor em ciência política Humberto Dantas, coordenador dos cursos de iniciação política da Fundação Konrad Adenauer no Brasil, ao classificar a nova regra como forma de corrigir a "distorção histórica" do processo eleitoral.

A visão de que a emenda corrige distorções também é compartilha pelos juízes Wander Pereira Rossette Júnior, Mauro Antonini e Rodrigo Pares Andreucci, titulares das 93ª, 270ª e 244ª zonas eleitorais. Eles estiveram na Câmara para conhecer o projeto Parlamento Aberto nas Urnas, no dia 13 de outubro, quando foram sabatinados por jornalistas dos departamentos de Comunicação e da TV Legislativa. 

Para Andreucci, o ponto positivo é que o fim da transferência de votos de um partido para outro trará mais unidade ao resultado das urnas. "A mudança é importante porque respeita a vontade do eleitor", avalia, ao completar que o fenômeno do candidato puxador de votos ainda existirá, porém, restrito à sigla partidária a que está vinculado: "ainda que exista o voto em massa em um único nome, não é justo que este candidato leve consigo quem teve votação inexpressiva e de outro partido". 

O juiz eleitoral acredita que a emenda veio para facilitar a escolha do eleitor no voto para vereador. “Teremos, pelo menos, linhas de pensamentos mais semelhantes entre os eleitos dentro de um partido. A coligação, muitas vezes, era composta para um acordo para a eleição majoritária, porém com linhas ideológicas distintas. A partir do momento em que havia a eleição, já acontecia o racha dentro do Legislativo", observa. 

COMPORTAMENTO – Tão logo as mudanças foram aprovadas, uma das incógnitas era o comportamento dos partidos frente às mudanças. Havia dois prováveis cenários, diz Dantas: "ou os partidos lançariam dezenas de chapas nos municípios, nos levando a mais de 1 milhão de candidatos a vereador, ou mostrariam aos eleitores que existem grupos políticos nas cidades, que detém os partidos políticos para os seus interesses e concentrariam suas campanhas em poucas chapas". 

Para ele, hoje é possível perceber o desenho do segundo cenário. "Em 2016, em média havia seis chapas de vereadores coligados ou independentes por cidade, com 16 partidos, em média, envolvidos nestas chapas. Já a média deste ano é de 7,6, ou seja, é mínima a diferença, o que nos mostra que os grupos políticos nas cidades têm muita força e conseguem articular minimamente os partidos políticos que possuem em suas mãos", analisa.

REFLEXO NO EXECUTIVO – Um reflexo da emenda constitucional 97/2017 é o percentual maior das candidaturas para o Executivo do que para o Legislativo em todo o Brasil. No caso de Piracicaba são 23 vagas na Câmara. Ao todo, 23 partidos na cidade encaminharam ao TSE o pedido de registros de 574 candidatos ao Legislativo (em 2016 foram 487 candidatos) e 12 para o Executivo (nas eleições anteriores concorreram oito nomes). 

Já no cenário nacional 19 mil pessoas se candidataram a prefeito este ano, enquanto em 2016 eram 17,6 mil concorrentes. Para o Legislativo, eram 463 mil em 2016 e agora são 515 mil candidatos. "Reza a lenda, nos cálculos dos partidos, que é preciso ter um nome forte no Executivo para puxar voto para o Legislativo. Mas os partidos se esquecem que nomes fracos afundam chapas para vereador", analisa. 

No entanto, Dantas acredita que a emenda constitucional 97/2017 não é o único fator que pesou para a alta das candidaturas ao Executivo. "Temos pessoas de fora da política ou que não estavam tão imersas nas estruturas partidárias eleitas para a presidência da República e para o governo de alguns estados", diz, ao trazer como exemplo Jair Messias Bolsonaro: "muita gente está de olho na prefeitura de sua cidade há muito tempo e talvez tenha visto que agora é uma hora interessante, inspirada por uma liderança que ascendeu ao poder de maneira inesperada e surpreendente, aos olhos de muitos." 

Apesar de ser visto como um possível exemplo a ser seguido para alcançar o Executivo, parte dos candidatos ignora vários fatores ligados ao atual presidente, avalia Dantas. "O que as pessoas não percebem é que a estratégia de Bolsonaro é de uma campanha intrapartidária há muitos anos, foi se estendendo e teve uma conjuntura favorável. Não tem nenhuma surpresa e nada foi inesperado." 

MINIRREFORMA – A alteração na eleição proporcional foi definida por meio de votações no Senado e na Câmara dos Deputados. As discussões começaram no Congresso em 2011 e, junto de outras mudanças aprovadas em 2017, ficaram conhecidas como "Minirreforma Eleitoral".

Uma das críticas feitas por Humberto Dantas é a de que nem a Constituição, promulgada em 1988, nem a lei eleitoral, de 1997, foram capazes de trazer estabilidade jurídica às sucessivas eleições, sempre regidas por mudanças. "Nunca uma eleição foi realizada neste país com as mesmas regras do pleito anterior", diz Dantas. "A reforma política, no Brasil, tem rigorosamente 32 anos. Desde que se promulgou a Constituição se fala em reforma política", completa. 

No entanto, Dantas acredita que a mudança nas eleições proporcionais torna mais fácil o entendimento do cidadão sobre a complexidade do sistema eleitoral brasileiro. "Apesar de muitas pessoas terem dificuldade de entender o sistema eleitoral, agora está mais fácil: o partido político ficará, em termos do número de cadeiras dentro do parlamento, com o equivalente às suas votações em termos proporcionais", explica o cientista.

CÁLCULO – Em linhas gerais, em uma eleição proporcional, a soma de votos válidos obtida por todos os candidatos é dividida pela quantidade de cadeiras na câmara municipal. O resultado obtido é chamado de quociente eleitoral. Um segundo passo é determinar quantas cadeiras cada partido tem direito, por meio da divisão do total de votos do partido ou coligação pelo quociente eleitoral. Esse é o número de vagas a que o partido terá direito, e, então, são considerados os votos individuais. 

Dantas acredita que a emenda constitucional colabora para o equilíbrio entre os poderes. "O Poder Legislativo vai contrabalancear a força do Poder Executivo. No Executivo, o vencedor leva tudo. Em uma cidade sem segundo turno, por exemplo, com quatro candidatos equilibradíssimos: um deles teve 26% dos votos está eleito. O que tem 26% leva 100%, mas terá de dialogar com o mosaico de partidos", analisa. "O sistema proporcional dialoga pluralmente com os partidos políticos", completa.

A emenda constitucional 97/2017 alterou ainda uma outra regra para municípios com mais de 100 mil eleitores: cada partido pode lançar até 150% do número de cadeiras nas câmaras. No passado, era permitido 200% (regra que permanece para as cidades com menos de 100 mil eleitores).

(Esta reportagem integra o projeto "Parlamento Aberto Nas Urnas", com conteúdo produzido pelos departamentos de Comunicação e TV Legislativa, da Câmara de Vereadores de Piracicaba. Além do texto, confira a reportagem em vídeo e em áudio. O infográfico pode ser baixado em formato .pdf, ao final deste texto.)

Cobertura Colaborativa Eleições 2020 Eleições 2020

Texto:  Rodrigo Alves - MTB 42.583
Supervisão de Texto e Fotografia: Valéria Rodrigues - MTB 23.343
Rádio:  Rodrigo Alves - MTB 42.583


Anexos:
ec chapas infografico.pdf


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