EM PIRACICABA (SP) 29 DE JULHO DE 2022

Em 1902, Câmara pedia construção de ramal ferroviário em Piracicaba

Ofício mostra que as negociações para criação de ramal da Companhia Paulista de Estradas de Ferro, inaugurado em 1922, começaram 20 anos antes




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A Companhia Paulista de Estradas de Ferro recebeu o ofício enviado pela Câmara em 1902; mesmo com a aprovação da criação do ramal, diversos outros empecilhos surgiram até a inauguração da estação, em 1922 / Acervo Câmara Municipal de Piracicaba




Em 1868, foi fundada a Companhia Paulista de Estradas de Ferro, com o propósito de atender a região de Campinas e seus arredores, onde, pelas perdas financeiras geradas pela Guerra do Paraguai, os trilhos da São Paulo Railway – primeira ferrovia do estado – não poderiam ser prolongados. O primeiro trecho da Cia Paulista, isto é, sua linha tronco, foi inaugurado em 1872 e inicialmente ligava Jundiaí a Campinas.

A partir disso, sua malha passou a se estender cada vez mais pelo interior paulista. Nesse momento, Piracicaba já apresentava grande produção agrícola, sendo um dos destaques econômicos da região, e contava com estação inaugurada pela Companhia Ytuana de Estradas de Ferro, que, ao ser incorporada pela Estrada de Ferro Sorocabana, em 1892, passou a se chamar Companhia União Sorocabana e Ytuana (Cusy). 

O que se relata, no entanto, é que a bitola estreita da linha da Cusy, de 1.000 milímetros, não permitia grande capacidade de carga, nem altas velocidades. Além disso, o trecho possuía curvas, aclives e declives, o que dificultava ainda mais o transporte. Dessa forma, a posição geral era a de que havia a necessidade de se buscar uma melhor alternativa. 

Por isso, em 26 de março de 1902, a Câmara Municipal de Piracicaba redigiu e encaminhou um ofício para a Cia Paulista solicitando a construção de um ramal que conectasse a cidade à chamada Villa Americana à época, através da estação São Jerônimo, ou em outro ponto considerado mais conveniente pelos técnicos. O documento faz parte do acervo do Setor de Gestão de Documentação e Arquivo da Câmara e mostra a argumentação desenvolvida pelas autoridades locais a fim de convencer o presidente e os diretores da companhia, a quem era destinado o ofício, a acatar o empreendimento:

“As condições especiais de prosperidade de nossa cidade, as suas fábricas, as suas numerosas escolas, a sua produção, a riqueza incomparável do município, dotado de terras ubérrimas e que se prestam às mais variadas culturas, a sua comprovada salubridade, a sua colocação no extremo navegável do rio Piracicaba, graças a qual há de ser sempre o centro forçado de comunicação dos proprietários e lavradores ribeirinhos desta importante e descurada via fluvial, são garantia segura do êxito do novo ramal” (em transcrição livre)

Como parte do discurso para despertar o interesse da companhia em construir o ramal, são destacadas, portanto, a capacidade fértil das terras piracicabanas, que produziam café, cana-de-açúcar e cereais, e a rica fonte permanente de água e energia hídrica – o Rio Piracicaba.

Segundo o documento, ainda, o município estaria disposto a destinar quantia “que se julgar conveniente” para a operação da linha e se sujeitar às cláusulas da companhia, combinadas em negociação que deveria ser pautada em “lealdade e justiça”. O ofício indica, além disso, que o presidente da Câmara em exercício, Paulo de Moraes Barros, seria o responsável pelas tratativas. 

20 ANOS DE ESPERA – Apesar da concordância da Cia Paulista com a construção do ramal, o Governo do Estado de São Paulo precisava aprovar a execução da obra. Isso porque um conflito foi gerado com a Cusy, que avaliava Piracicaba como parte de sua zona de privilégio – isto é, um local onde ela teria o monopólio das linhas. A aprovação do Governo do Estado veio 11 anos depois, no decreto 2.362 de 10 de abril de 1913, que assentiu a criação do ramal entre Nova Odessa e Piracicaba.

Apesar da aprovação, a Primeira Guerra Mundial, que durou de 1914 a 1918, configurou mais um empecilho para as obras, uma vez que os trilhos e acessórios para as ferrovias eram provenientes de países afetados pela guerra e tiveram sua produção suspensa.

Os trabalhos da construção foram retomados em 1919, no terreno doado por João Baptista da Rocha Conceição, dono da fazenda Algodoal, e a inauguração da Estação Piracicaba Paulista finalmente ocorreu com festividades no dia 29 de julho de 1922, 20 anos depois da redação do ofício. A partir dali, Piracicaba passou a contar com um transporte mais eficiente para o escoamento do açúcar e demais culturas que produzia e a oferecer maior mobilidade para a população que transitava pelo interior paulista.

O centenário da Estação da Paulista – que é, hoje, ponto turístico e aloja parque e centro cultural – será comemorado pela Câmara com programação especial, que inclui exposição com abertura marcada para esta sexta-feira (29), composta por fotografias e documentos do acervo. Os itens selecionados pela curadoria da exposição e outros serão disponibilizados na plataforma Atom, em coleção especial que pode ser acessada através deste link.

A digitalização e a transcrição do ofício citado podem ser conferidas nos anexos abaixo.

ACHADOS DO ARQUIVO - a série "Achados do Arquivo" se pauta na publicação de parte do acervo do Setor de Gestão de Documentação e Arquivo, ligados ao Departamento Administrativo, criada pelo setor de Documentação, em parceria com o Departamento de Comunicação Social, com publicações no site da Câmara, às sextas-feiras, como forma de tornar acessível ao público as informações do acervo da Casa de Leis.

Achados do Arquivo Documentação

Texto:  Laura Fedrizzi Salere
Supervisão:  Rodrigo Alves - MTB 42.583


Anexos:
02 - ofício (26-03-1902).pdf

transcrição ofpaulista-.pdf


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