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CPI do Semae flagra “caldeirão de esgoto” e suposta coleta maquiada
Em diligência, vereadores da Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara Municipal de Piracicaba verificaram descarte irregular de esgoto no Santa Rosa e Santa Terezinha
Vereadores da comissão verificaram descarte irregular no Santa Rosa e Santa Terezinha
Crédito: Guilherme Leite - MTB 21.401Uma água cinzenta e mau cheirosa, acompanhada por uma espessa camada de um lodo igualmente cinzento, escorre pela sarjeta da avenida Branca Azevedo, no bairro Santa Rosa. “É esgoto correndo a céu aberto”, diz a vereadora Rai de Almeida (PT), presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que analisa possíveis irregularidades nos serviços de água e esgoto na cidade. Criada em junho de 2021, a Comissão é também composta pelos vereadores Anilton Rissato (Patriota) e Thiago Ribeiro (PSC), como relator e membro, respectivamente.
“Esse limo, essa massa cinza que vocês estão vendo, são colônias de bactérias. Elas aparecem quando o esgoto já está correndo faz um certo tempo no mesmo lugar, não é algo que aparece da noite para o dia”, explica José Carlos Magazine, chefe da divisão regional Pauilceia do Semae (Serviço Municipal de Água e Esgoto), que acompanhou as diligências da CPI, na tarde desta segunda-feira (14), em busca de pontos de despejo irregular de esgoto na cidade.
“Isso está assim há quase 20 dias”, confirma Bem-Hur Redi, morador do bairro há 30 anos e que solicitou a presença da Comissão no local. “Eu, o Magazine e outros moradores do Santa Rosa fizemos um trabalho quase que arqueológico para achar esse e outros pontos de despejo de esgoto por aqui, que são vários", afirma.
A coleta, tratamento e destinação do esgoto em Piracicaba são, atualmente, geridos por uma parceria público-privada entre a prefeitura, por intermédio do Semae, e a concessionária Mirante.
Para a presidente da CPI, “o Semae está sendo negligente". "A Mirante é a praticante do ato, mas o Semae, na verdade, está silencioso, omisso no seu papel de fiscalizador, e isso é um problema. Para verificar se as cláusulas contratuais estão sendo cumpridas, é preciso vir a campo”, diz Rai.
"Coleta maquiada" - O esgoto que corre livremente pela sarjeta da avenida verte em fartos litros de uma caixa coletora, aparentemente entupida, localizada a poucos metros da pequena ponte que passa sobre o ribeirão Guamium, um afluente do Piracicaba.
A água leitosa ganha velocidade, desce a avenida e some por uma boca de lobo. Na sequência, reaparece em um cano logo abaixo da ponte e mergulha livremente, por mais cinco metros, até tocar as águas do Guamium.
Barranco abaixo, às margens do ribeirão, é possível ver a mistura entre a água limpa que brota das margens, quase cristalina, e a que desce pela boca lobo, espessa, leitosa e com um forte odor. Pequenos peixinhos, indiferentes ao falatório da comitiva que até lá desceu para ver mais de perto o despejo do esgoto, nadam e se escondem por entre as pedras.
Além da boca de lobo, o esgoto também flui para o ribeirão, segundo Magazine, por uma outra tubulação que sai da caixa coletora, chamada “extravasor”. Segundo o chefe de divisão do Semae, isso não deveria acontecer, pois a caixa coletora, como seu nome diz, deveria apenas coletar o esgoto e conduzi-lo para seu destino, e o extravasor, por sua vez, serviria apenas para momentos limítrofes de pressão no sistema, e não para escoar esgoto de forma constante.
“Então, isso significa que nem a coleta do esgoto nem o tratamento são feitos de forma correta?”, questiona Rai. “Isso aqui é uma maquiagem da coleta", diz Magazine, que ainda defende: “para resolver essa situação é necessário uma equipe de fiscalização acompanhando esse tipo de procedimento. Isso não pode acontecer. É um crime ambiental o que está acontecendo aqui, é uma coisa incabível.”
A opinião do técnico é também compartilhada pelo vereador, membro da CPI, Thiago Ribeiro: “Nós estamos com uma situação grave aqui. Esse esgoto, descartado irregularmente, ele vai para o nosso rio Piracicaba. Então, automaticamente, eu não sou engenheiro ambiental, mas para mim caracteriza-se um crime ambiental”.
Barranco acima novamente, uma surpresa: o esgoto que antes fluía livre pela sarjeta tem agora seu fluxo interrompido. Na caixa coletora - que minutos antes fora vistoriada pelos membros da CPI e pelo Semae- , uma equipe de cerca de três ou quatro funcionários da Mirante, com uma ferramenta alongada, desobstrui com sucesso a tubulação, e faz com que o esgoto volte a seguir seu correto destino. Segundo um dos funcionários da concessionária, uma ordem de serviço para refazer por inteiro a caixa coletora também fora emitida para o dia seguinte.
Tubulação rompida – Quilômetros à frente, no encontro das ruas Oliverio Porta e José Bessi, nas proximidades da avenida Euclides de Figueiredo, em Santa Terezinha, o característico odor do esgoto é mais uma vez o protagonista.
Desta vez ele contracena com uma grande quantidade de garrafas, sacos plásticos, latas e materiais dos mais sortidos e agora, novamente, jorra toda sua densidade cinza por uma tubulação alaranjada, que se encontra rompida, na altura do leito do córrego que passa pelo local.
Segundo Magazine, esse é um problema que se arrasta há anos: “toda vez que chove, essa tubulação se desconecta e o esgoto fica assim, vazando direto”.
José Laércio Andrade, que há mais de três décadas mora no bairro, corrobora a fala do servidor da autarquia e diz que a “Mirante não sai daqui, mas só tira fotos e vai embora”. Ele aguarda uma resolução para o problema e diz se sentir incomodado com o mau cheiro e com os pernilongos que, de acordo com ele, proliferam em abundância no local.
“Cada vez que fazemos uma diligência em campo nós nos deparamos com situações que nos levam a acreditar que o contrato que existe não é cumprido. Nós, da CPI, estamos aqui para apurar estes fatos e cobrar da empresa uma solução para o problema, mostrar para a população que a empresa que está aí não atende àquilo que foi proposto em contrato”, disse o relator da CPI, Anilton Rissato.
“A população não paga a tarifa do esgoto por bimestre, ela não paga por semestre, a tarifa é mensal. Ela não é obrigada a ver a cor dessa água e sentir esse odor próximo às suas residências”, diz Thiago Ribeiro.
Um caldeirão de esgoto - A poucos metros dali a equipe atravessa a avenida Euclides de Figueiredo e chega a uma viela, com cerca de dez casas, com suas varandas e janelas viradas para o Córrego Ondinhas.
Em sua margem brotam bananeiras, pés de acerola e de araçás. Galinhas, galos e pintinhos cruzam velozes o terreno e ajudam a compor um cenário quase idílico, que apenas é rompido pelas águas turvas de um rego d’água que desemboca no Córrego.
A equipe segue pelo asfalto, margeando o leito, e toca a campainha de uma casa localizada no fim da viela. O objetivo é conseguir passagem por dentro da casa, único caminho para se atingir uma ponte de madeira improvisada que dá acesso a uma área verde do outro lado do córrego. Por entre o mato alto, já é possível avistar a calha do canal que corre em paralelo e que, metros antes, desagua no Córrego das Ondinhas.
Novamente, o cheiro forte denuncia mais um ponto de descarte irregular de esgoto. Desta vez, a matéria em decomposição que sai de uma grossa tubulação da margem esquerda se acumula num braço do leito do canal e forma uma espécie de "caldeirão" acinzentado de excrementos que parece querer borbulhar. "Em dias de calor é quase impossível respirar aqui”, afirma Magazine.
A frase é quase idêntica à de Patrícia Sansão, que reside a poucos metros do local, em uma das casas da viela: “quando esquenta é terrível, ninguém aguenta. É um cheiro de carniça e de cocô. Eu moro aqui há quatro anos e sempre foi assim”, completa.
“É um tapa na cara da população piracicabana, que acha que está sendo atendida, paga 100% do que é cobrado na sua conta de água e esgoto e metade desse valor vai para essa empresa que não está cumprindo a sua parte do contrato”, diz Anilton Rissato.
“É importante dizer que a CPI, sozinha, se não tivéssemos os moradores, o próprio Magazine levantando, mostrando para a gente, nós jamais iríamos descobrir isso aqui. Isso mostra o quão importante é a comunidade e os servidores trazerem essas informações para nós”, afirma Rai de Almeida.
Próximos passos – De acordo com a presidente, a CPI deve ainda colher mais alguns depoimentos e realizar outras diligências. No entanto, segundo a parlamentar, já há farto material para consubstanciar o relatório final, que deve ser apresentado em maio deste ano, último mês de atividade da Comissão, e que não pode mais ser prorrogada.
“Nós não temos o poder de notificar a empresa, nós temos o poder de identificar o problema, analisar, e daí nós vamos fazer um relatório conclusivo, depois de tudo que nós vimos, e vamos apresentar ao Ministério Público para que ele tome as medidas cabíveis”, afirma Rai de Almeida.
Ela ainda acrescenta: “quando a Mirante foi contratada e foi estabelecida essa parceria, isso é hipótese, ela tinha 30% de esgoto para coletar e tratar. 70% já estava coletado e tratado. E aí, pelo que estamos vendo, esses 30% continuam sendo lançados nos rios, sem tratamento, mas eles [Mirante] recebem o valor cheio do contrato. Eles não têm nenhuma responsabilidade em relação às inadimplências e aos furtos de água, que são eles que fiscalizam, não têm nenhum interesse. E a gente precisa mudar essa situação”, conclui a vereadora.
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