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Especialistas listam aspectos que caracterizam a alienação parental
Evento na Câmara, nesta quarta-feira, trouxe profissionais do direito, da psicologia e da assistência social para falar sobre o tema.
Evento foi realizado no salão nobre, na tarde desta quarta-feira
Crédito: Guilherme Leite - MTB 21.401Com uma abordagem intersetorial, os aspectos que caracterizam a alienação parental foram detalhados em evento realizado na Câmara na tarde desta quarta-feira (27). Profissionais do direito, da psicologia e da assistência social chamaram a atenção para o impacto que se nota em crianças que acabam tendo prejudicado seu vínculo com pai ou mãe a partir de condutas induzidas pelo seu outro genitor (ou por avós que detenham sua guarda).
O evento foi promovido pelo vereador Pedro Kawai (PSDB), coautor do decreto legislativo 55/2017, que instituiu na Câmara a "Semana de Conscientização e Prevenção à Alienação Parental", coincidindo com o dia mundial dedicado à reflexão sobre o tema, em 25 de abril. Além do público que compareceu ao salão nobre, o conteúdo apresentado por especialistas pôde ser acompanhado ao vivo pela TV Câmara.
A alienação parental está caracterizada na lei federal 12.318/2010, que a define como "a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou o adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este".
Danielle Pupin Ferreira, presidente da Comissão de Direito de Família e Sucessões da Ordem dos Advogados do Brasil de Piracicaba, explicou os principais aspectos da legislação atualmente em vigor, que pode vir a ser mudada por projeto de lei já aprovado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal e à espera de sanção presidencial. Para a advogada, ainda que parte dos que atuam na área entenda que a Constituição Federal e o Código Civil contemplam o tema, a existência de uma lei que trata especificamente da alienação parental "traz garantias a mais" a crianças e adolescentes afetados pela prática.
Danielle citou exemplos de atitudes que configuram alienação parental, como dificultar o contato da criança com o outro genitor; realizar campanha de desqualificação da conduta do outro genitor como pai (ou mãe); dificultar os exercícios da autoridade parental e da convivência familiar; omitir deliberadamente ao outro genitor informações pessoais relevantes sobre a criança, inclusive escolares e médicas e alterações de endereço; e apresentar falsa denúncia contra o outro genitor ou familiares para dificultar a convivência com a criança.
A presidente da Comissão de Direito de Família e Sucessões da OAB de Piracicaba alertou para o fato de a alienação parental poder ser praticada tanto por quem possui a guarda da criança quanto por quem não a detém: está na legislação, salientou, o direito da criança conviver com pai e mãe "de forma plena e igualitária". "Filho não é 'visita'. Se um genitor impede de ter essa convivência ampla, está cometendo alienação parental", apontou.
"Muitos genitores acreditam que, por não ter a guarda do filho, não têm como saber das coisas que acontecem com ele. Têm, pois a lei é clara: o pai que não detém a guarda tem o direito e o dever de fiscalizar o que está acontecendo com aquele filho. O direito de informação é de ambos", acrescentou.
A advogada distinguiu três estágios em que a alienação parental se revela: leve, quando um genitor empreende junto ao filho campanha de desmoralização de seu ex-par, buscando afastar a criança dele; médio, quando o filho já não quer mais estar na companhia do genitor alienado; e grave, quando a criança não suporta mais qualquer contato com o genitor alienado, por conta das "falsas memórias" desencadeadas pelo alienador.
"O alienador implanta fatos falsos, que jamais ocorreram, na memória da criança, geralmente relacionados a maus-tratos, violência e abusos. Ele geralmente se fixa num ponto, falando de forma reiterada. A criança fica paralisada, ouvindo informações sem saber o que realmente aconteceu, se são verdades ou mentiras", disse Danielle.
Junto com as falsas memórias, outro aspecto observado no psicológico de vítimas de alienação parental é o chamado "conflito de lealdade". "Exige-se que o filho escolha entre um e outro genitor. Inicia-se uma campanha, com frases como 'Vai me deixar sozinho?' ou 'Se for com ele é porque não gosta de mim', gerando o temor na criança de ser abandonada caso escolha o outro", completou a advogada.
Danielle também explicou como se dá a tramitação quando um caso de alienação parental vai parar na Justiça. "Ele é noticiado por meio de um processo: a lei determina que o juiz que recebe essa informação deve encaminhar a criança para o setor psicossocial do Fórum para que ela passe por uma avaliação." A lei atual estipula prazo de 90 dias para a conclusão do processo, mas a proposta de atualização já aprovada no Congresso Nacional prevê dobrar esse tempo e incluir uma segunda avaliação.
"Assim, quando for noticiada a alienação parental, a criança e seus familiares vão passar por uma primeira avaliação e, antes de finalizar o processo, por uma segunda para verificar se teve ou não diferença no comportamento, podendo o processo agora perdurar por seis meses. Olhando para a prática forense, isso é muito positivo, porque não raras vezes um processo de alienação é concluído e, passados dois, três meses, tem que se entrar com um outro processo porque a medida aplicada ao alienador não surtiu efeito", observou Danielle.
Uma vez o laudo fundamentando a conclusão de que houve alienação parental, podem ser aplicadas as seguintes medidas no âmbito da Vara da Família: advertência, multa, inversão da guarda, alteração para guarda compartilhada, ampliação do regime de convivência familiar, acompanhamento psicológico, suspensão da autoridade parental do genitor alienador ou determinação de domicílio provisório da criança. Outras áreas da Justiça, como as Varas da Infância ou Criminal, podem ser acionadas se os casos também envolverem, por exemplo, agressões ou abuso sexual.
COMO IDENTIFICAR UM ALIENADOR - A psicóloga Juliane Martins, que atende crianças vítimas de alienação parental, chamou a atenção para o agravamento das situações com que tem se deparado em seu consultório. "Processos estão virando caso de polícia. Escolas e psicólogos estão tendo de lidar com essa realidade, de serem acuados e acusados. Estão extrapolando as vias do diálogo; a polarização parece que também está levando as famílias para esse caminho, com pais competindo um com o outro e crianças absurdamente carentes no meio disso", relatou.
Juliane listou as principais características do alienador. "No geral, ele não respeita regras, não obedece a decisões judiciais e insiste em continuar alienando mesmo com multa do juiz. Fala normalmente o que lhe convém, inclusive as mentiras, não tem remorso e se faz de vítima. Finge uma cooperação, muitas vezes mandando a criança para o pai ou a mãe e dizendo que a criança é que não quer ir."
"Ele manipula, tem perfil superprotetor e diz ter ou merecer uma 'exclusividade' em relação aos filhos. Possui sentimento de ter sido abandonado também pelo cônjuge, pode fazer falsas acusações de abuso sexual ou agressão contra o outro genitor e tem dificuldade de lidar com a frustração", acrescentou a psicóloga, citando ser comum o alienador mudar de advogado com o intuito de buscar um profissional "que faça o que ele deseja".
Traços narcisistas e possessivos também compõem o perfil de quem pratica alienação parental. "Ele vai fazer uma campanha direta de desvalorização do outro genitor: não tem nenhuma fala positiva com relação ao outro, fala mal dele para amigas, a família, na porta da escola; a criança ouve isso em todos os contextos." Segundo a psicóloga, a pandemia fez crescer o número de relatos de alienação parental: ela disse atender crianças "que não estão próximas dos pais há um, dois anos".
A preocupação com o aumento dos casos também foi citada por Pedro Kawai. "A pandemia foi muito usada, primeiro, como ferramenta para a violência, seja ela qual for, e, segundo, como desculpa [para justificá-la]", disse. O vereador propôs uma atuação conjunta para combater a alienação parental e lembrou a posição da Câmara na defesa de crianças e adolescentes.
"Se não trabalharmos a questão da conscientização e da informação, vamos ficar enxugando gelo. Temos de fazer o Judiciário também bater pesado, pegar essa bandeira de estarmos juntos. Tenho certeza de que muita gente virá junto, a Educação, os conselhos. Precisamos começar esse movimento e ter esse olhar", afirmou.
Também estiveram presentes no evento os advogados Ricardo Goldschmidt Beltrame, Daiane Castilho e Thiago de Souza Nogueira, que presidem, respectivamente, as comissões da Criança e do Adolescente, de Direito Civil e Processo Civil e de Prerrogativas da OAB de Piracicaba; o conselheiro tutelar Nivaldo Lima Filho e a presidente do Conselho Municipal da Mulher, Lia Mara de Oliveira.
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