EM PIRACICABA (SP) 09 DE NOVEMBRO DE 2023

'A médica me falou que não tinha soro', diz mãe de Jamilly

Patrícia das Graças Adriana Duarte, mãe da menina Jamilly, avaliou que houve "negligência" no atendimento à criança




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Mãe, tio e avô de Jamilly relataram à CPI como foi o atendimento da criança na UPA

Crédito: Guilherme Leite - MTB 21.401


O desconhecimento a respeito da presença do soro antiescorpiônico na UPA (Unidade de Pronto Atendimento) da Vila Cristina foi repassado a Patrícia das Graças Adriana Duarte, mãe da menina Jamilly Vitória Duarte, de 5 anos, que morreu após ter sido picada por um escorpião e passar pelo primeiro atendimento na unidade, no dia 11 de agosto.

Em depoimento à CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) formada na Câmara Municipal de Piracicaba para investigar o caso, nesta quinta-feira (9), a mãe da criança disse que a médica responsável pelo atendimento teria informado que não havia soro na UPA e que por isso ela seria transferida para a Santa Casa.

A UPA da Vila Cristina é ponto estratégico para atendimento de casos de picada de escorpião e estava abastecida com soro, mas a médica alegou à CPI, em depoimento anterior, que não sabia que havia o insumo no local. Transferida para a Santa Casa, Jamilly recebeu o soro, mas não resistiu e morreu na manhã seguinte, 12 de agosto.

Patrícia Duarte contou aos vereadores que estava na casa do pai, no bairro Santa Fé 1, desde a semana anterior ao acidente porque a casa em que ela morava com Jamilly pegou fogo. Ela disse que a criança estava brincando com um primo na calçada, por volta das 20h20. A mãe estava no interior da casa, ao telefone com uma cunhada quando ouviu o grito da filha. Segundo o relato, a menina entrou na casa e disse que tinha sido picada por alguma coisa no dedo do pé. A mãe disse que logo imaginou que seria escorpião. O avô da criança então saiu na calçada e conseguiu encontrar o escorpião próximo ao hidrômetro.

Patrícia Duarte disse que o irmão, que mora no bairro Santa Fé 2, foi avisado imediatamente, dirigiu-se até à casa do pai e levou as duas à UPA Vila Cristina, que é o ponto mais próximo. “Ali foi um momento de terror com a minha filha”, avaliou a mãe. “Eu não sabia o que fazer, só queria que passassem minha filha na frente, mas me disseram que eu tinha que aguardar como qualquer outra mãe. Quem estava lá viu o desespero da minha filha. Jamais imaginei que eu passaria por isso. Foi muita negligência da parte deles”.

A depoente relatou que Jamilly gritava de dor, enquanto ela tinha que fazer a ficha para o atendimento. A mãe disse que saiu sem os documentos da criança e que os dados foram preenchidos de forma errada. No acolhimento, a menina já começou a vomitar. “Fui para a sala da médica e ela atendeu com uma calma como se a Jamilly tivesse só com uma gripe”, colocou.

A criança foi então encaminhada para a Sala de Observação. Patrícia Duarte disse que se alterou quando a médica informou que ela estava recebendo soro fisiológico, dramin e dipirona e que havia acionado o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) para transferir a criança para a Santa Casa. A mãe questionou o motivo de ela já não receber o soro antiescorpiônico e, nesse momento, a médica teria dito que não havia na unidade.

“Eu alterei a voz e ela falou que não poderia ajudar se eu não me acalmasse”, afirmou. “Se não tinha o soro, já podiam ter avisado na recepção e a gente podia ir para outro lugar, o carro estava ali e não teria perdido tanto tempo”.

Patrícia Duarte também comentou sobre as dificuldades da equipe da UPA para manter o acesso venoso na criança. Segundo a mãe, assim que chegou, um dos membros da equipe do Samu questionou o motivo de a criança estar sem acesso, que nesse momento já havia sido perdido e os enfermeiros da UPA tentavam uma nova punção. “Eles estavam perdidos. Na minha opinião, quem entra nessa área tem que ter uma noção”, afirmou.

A mãe também relatou como foi o atendimento na Santa Casa, onde Jamilly chegou por volta das 22 horas e recebeu o soro antiescorpiônico imediatamente. Ela falou sobre a melhora do quadro, com o soro, depois a piora, durante a madrugada, e os momentos finais da filha, na manhã seguinte.

Familiares – A CPI também ouviu, nesta quinta-feira (9), os depoimentos do tio de Jamilly, Wilson das Graças Adriano Duarte, e do avô, Geraldo Fernandes Duarte. Eles relataram sobre o momento da picada, o socorro à Jamilly e a chegada à UPA, por volta das 20h40. O tio relatou que esperou o atendimento do lado de fora da unidade e que estava em contato o tempo todo com a mãe da criança pelo telefone. Ao ouvir a reclamação sobre a demora no atendimento, ele disse que tentou entrar na unidade, mas foi impedido pelo segurança.

“As falhas, a nosso ver, são visíveis, mas a mãe relatou a forma como ela foi tratada, a maneira como foi recebida, como o caso foi trabalhado”, avaliou o advogado da família de Jamilly, Luciano Alves Lima, que acompanhou os depoimentos junto com o colega João Mazzi Bruno. “As pessoas trataram como um atendimento comum. Essa visão foge dos protocolos que nós entendemos como de urgência e emergência. Isso demonstra, a meu ver, a falta de preparo para uma função tão importante como é a UPA”.

Para o advogado, os trabalhos da CPI vão contribuir para que situações como a de Jamilly não se repitam. “Está sendo um trabalho sério, que está buscando apontar as falhas e corrigir isso para que os fatos não voltem a ocorrer. Os vereadores estão fazendo um trabalho de forma ilibada, que acredito que terá um grande ganho para a sociedade de Piracicaba”, afirmou.

O presidente da CPI, vereador Acácio Godoy (PP), disse que era necessário, após os depoimentos dos profissionais que prestaram o atendimento, ouvir agora a versão da família. “Nós tínhamos a versão de quem prestou o atendimento e faltava fazer esse cruzamento das versões para testar, a partir do ponto de vista da mãe, como se deu o atendimento. Hoje a gente conseguiu fechar esse círculo entendendo do ponto de vista de quem atendeu e agora, de quem foi atendido”, afirmou.

Nesta sexta-feira (10), a partir da 8h30, está previsto o depoimento de um enfermeiro da UPA que prestou atendimento a Jamilly. Ele já apresentou sua versão à CPI em outro momento e agora foi reconvocado para prestar esclarecimentos. A CPI também é composta pelo relator, Gustavo Pompeo (Avante) e pelos membros, Cássio Luiz Barbosa (PL), o Cássio Fala Pira, Pedro Kawai (PSDB) e Paulo Camolesi (PDT).

Comissão Parlamentar de Inquérito Paulo Camolesi Pedro Kawai Cassio Luiz Acácio Godoy Gustavo Pompeo

Texto:  Aline Macário - MTB - 39.904
Supervisão:  Rebeca Paroli Makhoul - MTB 25.992
Revisão:  Erich Vallim Vicente - MTB 40.337

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