EM PIRACICABA (SP) 22 DE JULHO DE 2021

Violência que cegou líder comunitária gera mobilização na Câmara

Vice-presidência da Casa, Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania e Procuradoria da Mulher querem apuração do caso ocorrido no último dia 10.




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Crédito: Davi Negri - MTB 20.499


Convocada pelo vereador Acácio Godoy (PP), vice-presidente da Câmara Municipal de Piracicaba, uma reunião na tarde desta quinta-feira (22) marcou o início de mobilização para apurar o caso de violência que cegou a líder comunitária Josiane da Silva Souza, no último dia 10, durante ação policial no bairro Monte Líbano. Após ouvir relato da vítima, representantes do Legislativo analisam a convocação das autoridades de segurança para prestar esclarecimentos.

“Nós estamos aqui mais para ouvir do que para falar”, disse Godoy, ao enfatizar que o caso deve ser esclarecido. “Mesmo que a polícia tenha ido para atuar contra uma aglomeração, não se justifica o uso excessivo da força”, acrescentou. O parlamentar disse que irá convocar responsáveis da Guarda Civil Municipal e da Polícia Militar, além de buscar informações sobre o atendimento à vítima na Secretaria Municipal de Saúde, já que há denúncia sobre falta de transparência. 

Em um relato comovente, Josiane lembra que, na noite do dia 10, por volta das 21h, foi visitar uma amiga e, ao sair da casa dela, cerca de uma hora mais tarde, foi alvejada com dois tiros de bala de borracha. Um pegou na testa e o outro acertou em cheio o olho direito, deixando a líder comunitária com sequelas permanentes. “Eu não lembro de muita coisa, porque foi muito rápido e o impacto foi forte, apenas vi um rapaz tentando me ajudar e sendo impedido pelos policiais”, disse. 

Socorrida pela própria Polícia Militar, ela foi levada para a unidade de pronto-atendimento (UPA) do bairro Vila Cristina. Ao ser atendida pelo médico, veio a constatação de que estava cega do olho direito. “Eu fiquei desesperada”, disse ela, que agora está sendo atendida com acompanhamento de psicóloga.

Mesmo sendo um caso de emergência, familiares de Josiane relataram que houve falta de transparência e agilidade no atendimento de saúde, como a falta do registro de qual membro das forças de segurança levou a vítima à UPA e, depois, com o encaminhamento ao hospital sem o prontuário médico.

“Nós esperamos a semana inteira até liberar a cirurgia que ela precisou fazer no olho, mas na quinta-feira (15), a gente teve ficar 12 horas esperando, sem comer, sem tomar água e sem informação”, disse a irmã Rejane Souza.

Integrante da Procuradoria da Mulher na Câmara, a vereadora Ana Pavão (PL) se colocou à disposição para buscar informações que esclareçam a situação. “Como mulher, eu sei o que você passa e enfrenta de preconceito”, disse, “por isso devemos atuar nesta rede em torno de esclarecimento do ocorrido”, concluiu, ao destacar que é preciso “ouvir o outro lado” para entender o fato.

O vereador Paulo Camolesi (PDT), presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania, refutou qualquer ato de preconceito e classificou como “inaceitável” um caso em que, agora, a vítima terá que viver com uma sequela permanente. “Acho que devemos fazer de tudo para que o caso seja esclarecido, sempre tendo como foco a dignidade da pessoa”, enfatizou.

Suplente do vice-presidente da Mesa Diretora, o vereador Thiago Ribeiro (PSC) disse que o fato é “lastimável”. Ele convocou “união de forças” para que o caso seja esclarecido, com agilidade. “Precisamos encontrar e tomar as providências que resolvam essa violência sofrida por uma mulher trabalhadora”, disse.

O membro do mandato coletivo “A Cidade É Sua”, Jhoão Scarpa, mostrou indignação por “discursos que justificam a violência contra os negros”. Ele lembrou que o preconceito estrutural das instituições públicas tem contornos raciais e também sociais. “É inaceitável que isso ocorra a qualquer pessoa, mas sabemos que isso sempre acontece em comunidades pobres”, disse.

ORGANIZAÇÕES – A mobilização em torno do esclarecimento da violência sofrida por Josiane também envolveu organizações do movimento negro. Presidente do Conepir (Conselho da Comunidade Negra de Piracicaba), Adney Araujo disse que cobrança por esclarecimentos não é decorrência de “raiva” ou de um processo “inquisidor”. “Mas é pelo fato de que precisamos de respostas, existem muitas informações que precisam ser esclarecidas”, disse.

Representando o Centro de Documentação, Cultura e Política Negra, Agnaldo Oliveira se colocou à disposição para contribuir na apuração do caso. “Sabemos que a nossa comunidade é a que mais sofre com a violência das corporações de segurança, os dados são conhecidos”, disse, ao enumerar o Estado de São Paulo é o quinto no Brasil com o maior número de vítimas negras em ações policiais. 

O advogado Luciano Alves, da Comissão de Igualdade Racial da OAB Piracicaba, disse que a violência contra Josiane afeta toda a comunidade negra. “Não foi só você que perdeu um olho, todos nós perdemos junto com você, porque poderia ter sido qualquer um de nós que fosse vítima desta agressão”, disse.

Josiane é acompanhada pela advogada Lia Mara, presidente do Conselho Municipal das Mulheres, e pela psicóloga Juliane Martins de Oliveira, e recebeu solidariedade de assessoras parlamentares, como Bruna Togni, do vereador Camolesi, e de Bruna Campos, do gabinete de Acácio, ambas mulheres negras. “A gente sofre junto com você”, disse Togni. “É uma dor que nós sentimos, por isso estou muito emocionada”, disse Campos.

Legislativo Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania Procuradoria Especial da Mulher Paulo Camolesi Acácio Godoy Ana Pavão Thiago Ribeiro Silvia Maria Morales

Texto:  Erich Vallim Vicente - MTB 40.337
Supervisão:  Rodrigo Alves - MTB 42.583

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