Achados: por quem os sinos dobram? ou... os sinos devem dobrar?
Temor de revoltas de escravizados marcou a Piracicaba de 1858
Documento do acervo do setor de Gestão de Documentação e Arquivo da Câmara Municipal demonstra preocupação dos fazendeiros com repressão de revoltas escravas
No século XIX, diversas revoltas de escravizados aconteceram no Brasil e no mundo; fazendeiros da região da atual Piracicaba temiam levante / Créditos: Everett
A escravidão durou mais de 300 anos no Brasil, e sua drástica passagem por terras brasileiras pode ser comprovada através da história. Em relatos, documentos e testemunhos, constata-se a crueldade com a qual eram tratados os negros do século XIX. Além de serem tirados à força de suas terras e colocados para trabalhar de forma árdua sem quaisquer direitos, os negros eram submetidos a diversas outras formas de exploração, desde torturas psicológicas a físicas.
Diante de tanto sofrimento, os escravizados protagonizaram, diversas vezes na história do Brasil, revoltas motivadas pelo desejo de fugir da triste realidade em que viviam. Nelas, muitas vezes eles tentavam ferir aqueles que eram acostumados a feri-los sem nenhum motivo. Na Piracicaba do século XIX, chamada de Vila Nova da Constituição à época, a situação não era diferente. Sendo ela um dos municípios com maior número de escravizados da região, os fazendeiros escravocratas da região também tinham de lidar com as constantes revoltas escravas.
No acervo do setor de Gestão de Documentação e Arquivo da Câmara Municipal, encontra-se um ofício remetido ao presidente da Província pela Câmara de Piracicaba, datado de 7 de abril de 1858, no qual os senhores demonstravam preocupação com escravizados em estado de revolta e solicitavam armas para a Guarda Nacional, a fim de conter possíveis motins. No início do ofício, fica evidente o incômodo:
“Exmo. Sr.
A Camara Municipal desta Cidade da Constm. Tem a onra de representar a V. Exa. A necessidade de duzentas armas para fornecer a G. N. deste Municipio tendo já para mais de duzentas praças fardadas, e não tem armamento para fazerem serviço, alem diso torna-se de mais necessidade de haver armamento suficiente neste Municipio em razão de ser elle bastante grande, e ter grande escravatura, e três colônias anexas a ella...”
A razão da inquietação dos fazendeiros era a constante ameaça de revoltas de escravizados, como a recém ocorrida no engenho de açúcar de Torquato da Silva Leitão. Segundo o documento, o homem possivelmente foi ferido por escravizados que se rebelaram, porém encontrado com vida em uma estrada do engenho.
O ofício afirma, ainda, que a escravatura, de forma geral, achava-se "quase em revolta" e que já havia "alguma desordem" em algumas propriedades. O documento pode ser acessado na íntegra nos anexos abaixo, que trazem sua digitalização e sua transcrição.
ACHADOS DO ARQUIVO - a série "Achados do Arquivo" se pauta na publicação de parte do acervo do Setor de Gestão de Documentação e Arquivo, ligados ao Departamento Administrativo, criada pelo setor de Documentação, em parceria com o Departamento de Comunicação Social, com publicações no site da Câmara, às sextas-feiras, como forma de tornar acessível ao público as informações do acervo da Casa de Leis.
Com colaboração de Gabriel Tenório Venâncio.
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