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No início do Século XX, foi aprovada legislação que instaurou mecanismo para tentar moralizar o que era exibido nas salas de Piracicaba
Lei aprovada em 1922 instaurou a censura prévia nos cinemas de Piracicaba
Em meados do Século XVIII, “às vésperas” da Revolução Francesa – o evento que decapitaria, literalmente, as monarquias absolutistas europeias – o Barão de Montesquieu publicou, pela primeira vez, o livro-tratado ‘O Espírito das Leis’. Nele, além de classificar diferenças entre uma república e um Estado despótico, o filósofo iluminista analisa como as sociedades se constroem em verticalidades onde “um conjunto de regras se replica e se define por pontos como a geografia e a realidade histórica de um povo”.
Essa máxima sócio-política das repúblicas – e que também serve para monarquias constitucionais – é expressa nas diferentes legislações que, ao longo dos anos, a Câmara Municipal de Piracicaba discutiu e aprovou. Para o bem e para o mal, a cidade reflete no plano micro, condições e ideologias que são expressas de forma macro, nas Nações e ao redor do mundo.
Censura ao cinema aparece em diversos contextos sociais e políticos.
Seja nos Estados Unidos, com o Código de Hays (regras morais para o cinema, com vedação à nudez, à miscigenação, entre outros), ou sob a neurose macarthista na década de 1950, passando pela Alemanha nazista ou a Itália fascista da década de 1930, e ainda ao longo do período soviético durante o Século XX. Ou mesmo no Brasil do Estado Novo, de Getúlio Vargas, e a Ditadura Militar, a partir de 1964, sempre houve algum tipo de mecanismo em que a Sétima Arte ficou, de alguma forma, sob ataque.
Sob o disfarce da defesa da moral e dos bons costumes, a censura no Brasil das primeiras décadas do século passado teve como ponta de lança a Liga Antipornorgráfica da União Católica Brasileira, a qual tinha o poder de editar e proibir exibições de determinados filmes. Com o chamado “Centro da Boa Imprensa”, realizava avaliação e censura prévia das obras.
No início da década de 1920 – ainda com influência da moralidade –, inicia-se um combate mais assíduo contra o chamado “mau cinema” e uma maior exigência de interferência do Estados e dos poderes na regularização das produções e exibições. É nesse contexto que surge, em Piracicaba, a Lei 158, de 6 de fevereiro de 1922, que estabelece a censura das fitas cinematográficas. O primeiro artigo da lei deixa explícito seu objetivo:
“Art. 1°: Ficam proibidas, nas casas de espetáculos, as exibições de fitas cinematográficas que atentem contra a moral e que não tenham sido previamente censuradas por autoridade competente” (em transcrição livre)
A lei previa que as casas de exibição não receberiam alvará caso não submetessem para avaliação prévia o programa de exibição e as obras previstas. Cabia a um censor municipal examinar os conteúdos e ele tinha o poder de desqualificar o filme ou proibir a entrada de menores na exibição. O poder de censura, segundo a normativa, seria exercido por “pessoas idôneas”, indicadas pela Prefeitura. A legislação ainda impunha multa de 50#000 – ou seja, cinquenta mil réis – aos infratores.
Essa legislação está disponível no ATOM (Acess To Memory), sistema administrado pela equipe do Setor de Gestão de Documentação e Arquivo da Câmara Municipal de Piracicaba e que está disponível no site oficial do Legislativo (www.camarapiracicaba.sp.gov.br). A Lei 158/1922 é o item 109 do conjunto de Leis e Resoluções entre os anos de 1915 a 1925.
“O cinema foi alvo constante de censuradores. Além de instrumento de lazer, é mecanismo poderoso de transmissão de ideias, valores e ideologias”, diz Giovanna Calabria, chefe do setor e responsável pela pesquisa. “Censura é impedir o acesso e a difusão da diversidade e da pluralidade”, defende a arquivista.
ACHADOS DO ARQUIVO - A série "Achados do Arquivo" se pauta na publicação de materiais do acervo do Setor de Gestão de Documentação e Arquivo, ligado ao Departamento Administrativo. Ela foi criada em parceria com o Departamento de Comunicação Social, e conta com publicações semanais no site da Câmara, às sextas-feiras, como forma de tornar acessível ao público as informações do acervo do Legislativo.
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